Os empréstimos consignados do Auxílio Brasil têm dado o que falar. Nos últimos dias, relatos de beneficiários citando pagamentos adiantados ou indevidos inundaram as redes sociais. E o cenário, segundo a diretora de relações institucionais da Rede Brasileira de Renda Básica, Paola Loureiro Carvalho, preocupa cada vez mais.
"Já havia uma preocupação com o modelo que vinha sendo colocado pelo governo federal, no qual apesar de um relativo controle em relação aos juros, o formato muitas vezes não deixava claro para as famílias os detalhes do compromisso que elas estavam assumindo", conta.
"Um exemplo é que não ficou claro para algumas pessoas que mesmo no caso de serem desligadas do programa, as parcelas do empréstimo continuariam a ser cobradas. Já outras pessoas acabaram surpreendidas pela indicação de um desconto antes da data prevista”, disse a executiva.
Nesta terça-feira (15), somou-se mais uma camada de incerteza: o procurador-geral da República, Augusto Aras, enviou manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF) na qual disse que o empréstimo consignado do Auxílio Brasil é inconstitucional.
Aras se posicionou em uma ação, protocolada pelo PDT no STF, que pede o cancelamento do consignado do Auxílio Brasil. Na argumentação do procurador-geral, essa modalidade de consignado fere a dignidade das pessoas, na medida em que leva ao superendividamento de vulneráveis
“O que fez a lei impugnada, ao aumentar os limites para (ou possibilitar) a contratação de empréstimos com pagamento descontado em folha pelo INSS ou pela União (crédito consignado), foi retirar uma camada de proteção a direitos da população hipossuficiente”, escreveu Aras.
Empréstimo negado, desconto cobrado
A maioria dos relatos cita que o desconto da parcela do empréstimo já está prevista para o calendário de novembro, cujos pagamentos começam no próximo dia (17).
“O que impressiona são as diferentes situações. Pessoas que sequer conseguiram sair do processamento do consignado e que não receberam o crédito, começaram a citar a previsão do desconto já neste mês”, disse Paola Carvalho.
Erika da Silva Lima, 21, de Bom Conselho (PE), decidiu pegar o empréstimo para conseguir quitar algumas dívidas. Mas, em vez de dinheiro, conseguiu problemas.
“Entrei em contato com um representante, ele fez o meu cadastro e ficamos aguardando. De início, consegui formalizar a proposta por meio de um link, mas depois de um tempo sem resposta, pedi para que meu representante averiguasse se havia alguma novidade e havia uma nova mensagem, dizendo que eu não tinha margem para empréstimo consignado. Eu, então, pedi para cancelar”, disse Lima.
Mas ela ficou surpresa ao entrar no aplicativo Caixa Tem e perceber que, mesmo com a negativa do empréstimo, o desconto de uma parcela de R$ 260 estava previsto no próximo pagamento do Auxílio.
“Mostrei o extrato de todas as minhas contas para o meu representante e cheguei a ir à Caixa [Econômica Federal] para saber o que estava acontecendo. A instrução foi apenas para que eu esperasse, então é o que estou fazendo”, afirmou.
Situação parecida com a da cabelereira Beatriz Ferreira Pinto Rodrigues, 28. Ela diz que viu no empréstimo a oportunidade para montar seu próprio salão e poder continuar trabalhando.
“Eu fiz uma simulação pelo aplicativo Caixa Tem, mas desde então o sistema só mostra que a solicitação está em processamento, sem dizer se o crédito seria liberado ou não. O problema é que, mesmo sem receber a confirmação ou o dinheiro do empréstimo, o aplicativo ainda indica um desconto de mais de R$ 160 previsto para o pagamento de novembro”, contou.
Mãe de três crianças, Rodrigues planejava pagar as parcelas do empréstimo por meio do próprio trabalho com o salão novo.
“Agora eu já saí do serviço em que estava contratada e estou trabalhando a domicílio, já que tenho as minhas clientes. A ideia seria usar o dinheiro que eu receberia com esses serviços para honrar o compromisso, já que todo o resto do auxílio vai para os meus filhos. Mas agora, só me resta esperar”, disse.
O que diz a Caixa
Questionada sobre os casos e reclamações, a Caixa informou que iniciou o envio de uma mensagem explicativa pelo aplicativo Caixa Tem aos clientes do Consignado Auxílio para que as dúvidas sobre os descontos das parcelas fossem esclarecidas.
“Conforme disposto no Art. 28 da Portaria 816 do Ministério da Cidadania, o primeiro desconto no benefício ocorre no mês subsequente ao do envio das informações pelas instituições financeiras”, afirmou o banco em nota, destacando que os descontos das parcelas do consignado “obedecem a averbação realizada pelos bancos junto à Dataprev”.
Já para aqueles que não reconhecerem a contratação do empréstimo e tenham uma parcela debitada indevidamente, a instrução da instituição é que os beneficiários liguem para os canais de atendimento do Ministério da Cidadania pelo número 121 para verificar a instituição financeira onde o contrato foi celebrado e solicitar o ressarcimento.
“Caso o cliente identifique algum desconto supostamente incorreto no seu benefício na Caixa, o banco solicita que ele se dirija a uma agência com CPF e documento de identificação com foto para que seja providenciada a correção necessária”, disse a Caixa, reiterando que um vídeo para esclarecer as principais dúvidas também foi disponibilizado em seu canal no Youtube.
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